Gota de gordura saudável sendo despejada em laboratório de alimentos, representando inovação tecnológica na indústria alimentícia.

Nova patente de gordura saudável revoluciona alimentos no Brasil

As gorduras fazem parte do nosso dia a dia e uma patente desenvolvida por pesquisadores do PBIS – Plataforma Biotecnológica Integrada de Ingredientes Saudáveis é um passo significativo para que a indústria de alimentos incorpore em seus produtos uma gordura saudável.

O papel das gorduras para Indústria e para vida das pessoas

As gorduras são componentes essenciais na nossa alimentação e no funcionamento do organismo. Elas fornecem energia, participam da formação das membranas celulares, atuam na produção de hormônios e ajudam na absorção de vitaminas lipossolúveis, como as vitaminas A, D, E e K.

Mas o papel das gorduras vai além da saúde. Na indústria de alimentos, elas são ingredientes-chave para garantir sabor, textura, cremosidade, espalhabilidade e estabilidade dos produtos. São fundamentais na produção de chocolates, biscoitos, patês, maioneses e pastas de avelã com chocolate, por exemplo.

Atualmente, entre as gorduras mais utilizadas pela indústria de alimentos está a gordura de palma, reconhecida por sua estabilidade e versatilidade tecnológica. Ela ajuda a manter a textura consistente dos produtos, evita a rancificação — aquele gosto e odor desagradável de gordura oxidada — e prolonga a vida de prateleira dos alimentos industrializados.

No entanto, a gordura de palma também apresenta alto teor de ácidos graxos saturados, o que tem gerado preocupações nutricionais, já que o consumo excessivo de gorduras saturadas está associado ao aumento dos níveis de LDL-colesterol (o chamado “colesterol ruim”), um dos fatores de risco para doenças cardiovasculares.

Mas calma! Isso não significa que todo alimento que contém gordura saturada fará mal à saúde, eles são seguros para consumo, o importante é sempre avaliar o contexto da dieta como um todo.

Buscando alternativas seguras, saudáveis e sustentáveis: a gordura saudável estruturante desenvolvida pelo PBIS

O papel do pesquisador é justamente esse: buscar alternativas que complementam de forma segura, saudável e sustentável as opções já existentes no mercado. No caso das gorduras, isso significa desenvolver ingredientes que mantenham a funcionalidade e o sabor que os consumidores esperam, mas com um perfil nutricional mais equilibrado e menor impacto ambiental.

Foi nesse desafio que os pesquisadores do PBIS chegaram a uma solução inovadora: uma gordura saudável estruturante sem palma, com desempenho tecnológico comparável ao das gorduras de palma tradicionalmente usadas na indústria alimentícia. Essa nova gordura foi pensada para atender diferentes aplicações industriais, podendo ser usada em produtos como chocolates, biscoitos, recheios, patês, maioneses e pastas de avelã com chocolate.

Os testes conduzidos pela equipe mostraram que a gordura saudável estruturante é capaz de substituir integralmente a gordura de palma em algumas formulações, como em spreads cremosos (exemplo: pastas de chocolate com avelã e manteiga de amendoim), mantendo as características de textura, espalhabilidade e estabilidade do produto final.

Além disso, os estudos preliminares indicam que essa nova gordura estruturante pode ser absorvida em menor quantidade pelo organismo, quando comparada às gorduras convencionais, o que contribui para reduzir o aporte calórico dos alimentos em que é incorporada. Outro aspecto observado foi o potencial de prolongar a sensação de saciedade, devido ao processo de digestão mais lento dessa gordura.

Infográfico explicando a nova patente de gordura saudável estruturante desenvolvida para diferentes tipos de alimentos como pastas, biscoitos e maioneses.

Essa capacidade de substituir até 100% da gordura saturada de palma, com uma formulação que utiliza óleos vegetais selecionados e processos tecnológicos avançados, representa um avanço importante para a indústria de alimentos, que busca continuamente novas formas de oferecer produtos mais alinhados às expectativas de saúde, sustentabilidade e qualidade sensorial dos consumidores.

A patente foi registrada no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) em maio de 2024, como: “Gordura estruturante, produto alimentício com textura espalhável e/ou macia compreendendo a referida gordura e processo de fabricação do mesmo, e usos da referida gordura estruturante”.

 Vale a pena conferir nosso conteúdo: Lipídios de baixa absorção: inovação para alimentos saudáveis. Lá você vai descobrir como os pesquisadores chegaram nessa gordura estruturante.

Conversamos com a Dra. Gabriela Macedo, líder da equipe de desenvolvimento da nova gordura saudável estruturante

Para entender melhor o processo de desenvolvimento dessa gordura saudável e os próximos passos da pesquisa, convidamos a Dra. Gabriela Macedo, pesquisadora da Unicamp e líder da equipe responsável por essa pesquisa, para responder algumas perguntas. Confira abaixo o bate-papo com quem está na linha de frente dessa inovação!

  • Quando ocorreu a percepção de que o que vocês tinham em mãos realmente poderia ser uma tecnologia patenteável?

Dra. Gabriela Macedo:
“A pesquisa com esses lipídios começou bem antes do PBIS, mas no início eu ainda não tinha clareza sobre a aplicação prática deles na indústria. Mesmo com resultados promissores nos estudos nutricionais, ainda não havia uma inovação suficiente para uma patente. Foi com o desenvolvimento do PBIS, ao começarmos a testar essas gorduras em diferentes alimentos, que percebemos o real potencial: além de contribuir para a redução de ganho de peso, a gordura também apresentava desempenho tecnológico para substituir as gorduras tradicionalmente usadas pela indústria. A partir daí, entendemos que tínhamos uma formulação inovadora e uma aplicação concreta, o que abriu caminho para o pedido de patente.”

  • Qual a sua expectativa para incorporação dessa nova gordura estruturante pela indústria de alimentos? Em quais tipos de alimentos essa gordura pode ser aplicada?

Dra. Gabriela Macedo:

“Os testes pilotos mostraram bom desempenho tanto em estabilidade quanto em aceitação sensorial. Minha expectativa é que a indústria possa usar essa gordura em diferentes níveis de substituição, desde 20%, 30% até 100%, dependendo do objetivo: reduzir gorduras saturadas, diminuir a absorção calórica ou ter um ingrediente com melhor perfil nutricional. Além disso, a gordura estruturante tem mostrado potencial para uma gama ampla de aplicações: de spreads, margarinas e recheios aerados até massas de panificação, chantilly, sorvetes e até maioneses.”

  • Essa nova gordura é segura para saúde das pessoas? Quais benefícios ela pode trazer?

Dra. Gabriela Macedo:

“Essa gordura é produzida a partir de lipídios já utilizados como alimento em outros países, então, do ponto de vista de segurança, não temos nenhuma preocupação. Claro que ainda será necessário realizar os trâmites regulatórios no Brasil e definir os limites seguros de consumo para humanos, como acontece com qualquer novo ingrediente. Até o momento, os estudos que fizemos em modelos animais mostraram resultados bastante promissores, sem efeitos adversos relevantes.

Em relação aos benefícios, nossos experimentos indicaram uma redução na absorção de gordura, o que pode contribuir para diminuir o aporte calórico de alimentos formulados com essa gordura. Também observamos efeitos positivos no perfil lipídico e inflamatório dos animais testados, além de uma sensação prolongada de saciedade, possivelmente devido à digestão mais lenta. Esses são resultados iniciais, mas que reforçam o potencial da nossa gordura estruturante como uma alternativa mais saudável para aplicação em alimentos industrializados.”

  • O que vem pela frente na pesquisa? Existe previsão para alimentos com essa tecnologia chegarem aos mercados?

Dra. Gabriela Macedo:

“Estamos em um momento crucial. Já protegemos a tecnologia com o depósito da patente e agora o próximo passo é realizar testes em escala industrial. As empresas parceiras do PBIS têm prioridade para avaliar e licenciar a tecnologia, e algumas já demonstraram interesse. Como o processo de produção da gordura estruturante é compatível com os equipamentos que a indústria já utiliza, acreditamos que a transferência de tecnologia pode acontecer de forma relativamente rápida.

Além disso, seguimos avançando em outras frentes de pesquisa: estamos validando o uso da gordura em diferentes aplicações alimentícias, incluindo análises sensoriais e testes in vivo, e também desenvolvendo novas formulações com foco em redução de gordura saturada e prevenção da obesidade. Nosso objetivo é ampliar ainda mais as possibilidades de aplicação dessa tecnologia.”

PBIS um projeto inovador!

A patente da gordura estruturante é um marco importante para o PBIS – Plataforma Biotecnológica Integrada de Ingredientes Saudáveis, coordenada pelo ITAL com apoio da FAPESP e parceria com universidades, institutos de pesquisa, empresas e governo. O projeto segue o modelo da tríplice hélice de inovação, conectando ciência, setor produtivo e políticas públicas para criar soluções saudáveis, sustentáveis e com aplicação real no mercado.

Quer saber mais sobre o PBIS e acompanhar os próximos avanços? Acesse o site oficial www.pbis.org.br e siga o projeto no LinkedIn.

Descubra também por que que o PBIS é um projeto inovador em: PBIS mostra como a pesquisa colaborativa pode transformar a indústria de alimentos.

Informações sobre a patente de gordura saudável do PBIS, destacando benefícios nutricionais, substituição da gordura de palma e compromisso com a sustentabilidade.

Texto desenvolvido por

Descascando a Ciência: empresa de comunicação que traduz a ciência em conteúdos estratégicos e acessíveis. Atuamos com planejamento, produção e divulgação de pesquisas e tecnologias para aproximar ciência, sociedade e mercado.

Principais referências

Alves, V., et al. Structuration of lipid bases zero-trans and palm oil-free for food applications. Food Research International, 2024.

Malveira, A. S., et al. Could New Palm-Free Structured Lipids Mitigate Postprandial Hyperlipidemia and Inflammation Induced by High-Fat Meals in Swiss Mice? Journal of the American Nutrition Association, 2025.

Zuin, J. C., et al. Structured Nanoemulsion Lipid as Alternative to Obesity Control: An In Vivo Study. Food Science & Nutrition Research, 2024.