Fundamentação da pesquisa: da necessidade à inovação
Os gargalos da produção tradicional e os desafios da biotecnologia
A proteína doce taumatina é atualmente extraída da planta africana Thaumatococcus daniellii, com baixo rendimento e dependência de uma cadeia produtiva limitada. Produzi-la de forma sustentável e em maior quantidade é um desafio tecnológico que pode ampliar o acesso a adoçantes naturais, com melhor perfil sensorial e segurança metabólica. Além disso, a produção de oligossacarídeos com ação prebiótica demanda estratégias eficientes e versáteis de engenharia enzimática.
Entre os desafios enfrentados estão a expressão eficiente de proteínas vegetais em microrganismos, a escolha do melhor organismo hospedeiro e a adaptação das condições de cultivo para maximizar o rendimento sem comprometer a funcionalidade dos ingredientes.
Uma plataforma baseada em engenharia genética e fermentação
A proposta da plataforma é desenvolver um microrganismo geneticamente modificado (cell factory) para produção da taumatina e de fibras prebióticas com aplicabilidade industrial. O projeto envolve a síntese de genes otimizados para a expressão heteróloga, desenvolvimento do vetor de expressão, inserção do gene em fungo filamentoso e avaliação de diferentes condições de fermentação. O microrganismo será projetado para secretar a proteína diretamente no meio, facilitando o processo de purificação.
Em paralelo, também serão desenvolvidas enzimas para produção de oligossacarídeos a partir de biomassa vegetal, com foco em matérias-primas como a cana-de-açúcar.
Por que usar fungos filamentosos? A escolha do chassis e da estratégia
Três possíveis chassis microbianos foram avaliados: Escherichia coli, leveduras e fungos filamentosos. A escolha recaiu sobre o fungo filamentoso Myceliophthora thermophila, por ser eucarionte, realizar modificações pós-traducionais compatíveis com a proteína vegetal e secretar a proteína no meio de cultura, facilitando a recuperação.
A maltose foi escolhida como fonte de carbono para indução da expressão, por ser barata e amplamente disponível. Também serão testadas fontes alternativas como o melaço de cana. A partir do modelo de fungo já utilizado na EEL-USP, pretende-se evoluir para um microrganismo mais robusto, adequado à produção industrial.
Metas técnicas que guiam a inovação
A plataforma estabeleceu metas técnicas claras:
- Construção de quatro ou mais clones contendo sequências gênicas otimizadas das proteínas doces, preparadas para inserção no fungo.
- Otimização das condições de fermentação para maximizar a secreção de proteínas, variando fonte de carbono, meio de cultura e tempo de cultivo.
Além disso, a meta é avaliar diferentes proteínas doces com potencial substitutivo à taumatina e desenvolver enzimas capazes de transformar biomassa vegetal em oligossacarídeos com propriedades prebióticas.
Da pesquisa ao pacote tecnológico
Como vimos, os pesquisadores da Plataforma III estão desenvolvendo um pacote tecnológico completo para a produção de ingredientes funcionais — mais especificamente, proteínas doces e fibras prebióticas — utilizando fungos geneticamente modificados como fábricas celulares.
A partir desse pacote, espera-se produzir ingredientes que possam ser incorporados em alimentos como chocolates, balas, confeitos e bebidas, com foco em sabor, funcionalidade e apelo clean label. A etapa seguinte do projeto envolve a validação da proteína produzida em diferentes matrizes alimentares, avaliando sua estabilidade, manutenção do poder adoçante e interações com o alimento. Esse processo será realizado em parceria com o Ital.
A expectativa é que os resultados da Plataforma III contribuam para o desenvolvimento de adoçantes e ingredientes funcionais nacionais, com potencial para aplicação em alimentos, bebidas e até cosméticos — substituindo compostos menos sustentáveis e atendendo à demanda por produtos com apelo natural e funcional.
A equipe da plataforma é composta pelos seguintes pesquisadores:
Dr. Fernando Segato, Dra. Gabriela Berto, Msc. Júlia Ortega, Igor Polikarpov, João Victor André Silveira e Pedro Ribeiro Faria.